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Por Carlos Monteiro
Com a dádiva de Oxalá, a sagração de Bragi, Apolo, Calíope, Érato, Euterpe, Polímnia e Terpsícore. Com as bênçãos de Homero,
Camões, Shakespeare, Pessoa e Neruda. Com a bendição de São João da Cruz, peço licença a ‘Licença Poética’ para dar uns pitacos nessa tal de sutil metáfora subliminar.
O que será que me dá, em todos os sentidos, o que não faz sentido. Será que o meu chamego quer me judiar?
Já repararam que muitas poesias musicadas não fazemsentido? Bradarão os eloquentes puristas da ‘Flor de Lácio’: mas é licença
poética. Para ela tudo vale, é como se fosse assim uma casa da avó Joana ou Maria, não importa. Lá tudo pode, para, na segunda-feira, após o fim de semana de traquinagens e traquinices, os pais arrancarem os cabelos ao ouvirem a sublime frase:
— Eu quero voltar para casa da vó; lá eu posso tudo! Quase uma ode do síndico no ‘vale tudo’ da vida, sem violência, é claro!
Com licença, mas na partitura eu pergunto e questiono: pode haver erro de concordância? Pode! Pode confundir ‘lé’ com ‘cré’ e ter um sapato em cada pé? Pode!
Pode viagem imaginária no país do Baurets? Pode!
Pode Raulzito, Caetanear e Djavanear? Esses tudo podem!
Valem o que vier e quiserem, valem cada estrofe, cada verso de sutilezas.
Caetaneando fui à Sampa e me encarei frente a frente, sem ver rostos. Mas dá para encarar lado a lado, tipo ombro a ombro? Ah,
Narciso acha feio o que não é espelho. Então dá! Djavaneando descobri que “…Zum de besouro um ímã/Branca é a tez da manhã…”.
Os besouros costumam ser perseguidores, fazendo zum-zum na testa como as abelhas rainhas. Só discordo da ‘branca tez da manhã’; nunca a vi branca e olha que de alvorada eu entendo um pouquinho, quase nada, mais que nada, sai da minha frente que eu quero passar.
Controlando a minha ‘maluquez’, bebi na fonte de Rauzito>
… Aprendi o segredo. O segredo da vida.
Vendo as pedras que choram sozinhas no mesmo lugar…
Raul Seixas
As pedras choram solitárias porque não conversam com as rosas. Também pudera; as rosas não falam, não é mesmo Mestre Cartola?
Bilac responderia:
Ora, direis, ouvir estrlas, certo
Perdeste o senso, e eu vos direi, no entanto
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…
Olavo Bilac
As rosas falam, as pedras falam e as estrelas, em toda Via Láctea, sussurram palavras de amor, enquanto se procuram mesmo estando a capa pendurada. A mais incrível metamorfose, seja ela ambulante ou errática. Metal, sopro do dragão tatuado no braço, porque na minha terra tem Lua e estrelas no anel.
Chico tem um cavalo que só fala inglês. PSIs – Puro Sangues Ingleses só atendem ordens em anglo-saxônico. Muita sofisticação para essa raça tão imponente. Godiva na obrigação de ser feliz. Heróis do faz de contas nacional. ‘El-Rey, Sua Magestade RC’, tem um cão que, ao chegar ao portão, sorri latindo. É um ‘Samoieda’, o cão que ri! Tão simples de explicar, tão fácil de entender. “…Uma fuga é o início de uma guerra/Onde tudo é permitido…”
Algumas vezes a explicação se torna mais complicada. Nunca consegui perceber o porquê de alguém sem bermuda ficar mais sério. Sempre pensei que era melhor estar vestido, do que estar sem nada ou de calção, corpo aberto no espaço. Onde o pano de chão de giz é de linho, que a pouco, no campo inda era flor, de seda invisível, retalho de cetim.
Quem me dera ao menos uma vez explicar o que ninguém consegue entender. Quem me dera. Que mais tem de acontecer no mundo para que eu possa cantar: “…Quem me dera/Abraçar-te no outono, verão e primavera/Quiçá viver além uma quimera…”.
Se, muitas vezes, o sentido perde completamente a noção da hora, muita gente canta jogando tudo fora. É um troca-letras danado que nos faz perder a razão. Será mesmo o poeta um fingidor?
Cláudio Zoli, em noite de prazer, passou a madrugada com a vitrola rolando um blues
trocando de biquini ou tocando B.B. King? Roupa nova, num “Whisky a Go-Go”, perguntava em holandês “Do You Wanna Dance”? Não era o Johnny Rivers que questionava “ …Tell me that I’m your man/Baby, do you wanna dance?…”.
Isso não é inglês? Cós’diabos alguém pode achar que da terra mater de Rembrandt alguém quer dançar?
Quem sabe, “Nossos Pais” fritavam os filhos e você que é mal passado e que não vê que o novo sempre vem. Por supuesto o Rei Mago não pensava assim. Amava o passado com as coisas que aprendeu nos discos.
A eterna Cássia e seu príncipe que “…virou um sapo, que vive dando no meu saco…”. Os príncipes viram sapos e vice-versa. Qualquer conto de fadas, até o português da piadinha do motel e o nome sugestivo, sabe disso, mas dar no saco depois de sapo?
Quem ‘dá no saco’ é um chato de galochas: “…o príncipe virou um chato, que vive dando no meu saco…”. Precisamos de mais malandragem.
Amarelo deserto e seus temores. Temo amar esse deserto djavaniano, para não entrar de caiaque em navios, muito menos pelo cano marinheiro. Descascar batatas não é meu forte. Também não quero fazer amor na madrugada com jeito de pirata, canguru perneta. Prefiro de virada, terra dourada, na verdade adorada.
Como não nasci há dez mil anos (atrás) e tenho a letra ‘A’ em meu nome, vejo o mel desses olhos luz castanhos tamanhos, mel de cor ímpar, de mar, águas-marinhas, átomos que dançam na madrugada, reluzente neblina, cor de romã, açaí guardiã, sabor das massas e das maçãs, porque quem gosta delas, irá gostar de todas.
Quero ver as águas do rio correr, assim no infinitivo, pasqualizando corretamente. Gente, espelho da vida, doces mistérios mil, coração do meu Brasil.
Carlos Monteiro é carioca da gema, nascido no bairro de Santa Teresa, cresceu aos pés do Redentor. Flamenguista, portelense, frequentou o Pier, em Ipanema, desde sua criação. Fotojornalista, cronista, jornalista e publicitário desde 1975, trabalhou em alguns dos principais veículos nacionais, incluindo Revista O Cruzeiro, Jornal dos Sports, História e Glória do Rock e diversos outros como freela – Folha de São Paulo, O Globo, JB. No Jornal O dia publicava diariamente a fotogaleria, Alvoradas Cariocas, retratando o amanhecer de algum ponto da Cidade. Atualmente é cronista do jornal carioca Correio da Manhã, dos portais Rede Lume de Jornalistas de Londrina, Anna Maria Ramalho do Rio de Janeiro e Os Divergentes de Brasília e a Revista Nova Família. É, também, publicitário na Agência Saravah Comunicação onde atua como diretor. Tem três livros Fotograficos publicados sobre o Rio, retratando ângulos especiais e diferentes da Cidade Maravilhosa. Colunista da Revista Nova Família.
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