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No dia 03 de março se completaram três quartos de século, desde o lançamento em 03.03.1947, por seus autores, #LuizGonzaga e #HumbertoTeixeira, dessa que é tida como o #HinoNordestino, tão bela e envolvente que já conta mais de uma dezena de gravações, nos mais diversos idiomas, inclusive Japonês. Persiste sendo das mais tocadas -e ouvidas- de todo o rico cancioneiro do #Brasil.
Por Alcir Santos
Ela é a última a deixar a terra calcinada do sertão que está em fogo – que vira fogueira de São João, como nós dizemos na letra – é a última que deixa.
Tanto que, quando ela sai de um estado pra outro, no outro estado ela é chamada de pombinha estrangeira, porque ela vai como anunciadora da desgraça, da fome, da seca que tá se alastrando, tá indo de um lugar para outro lugar
Humberto Teixeira
Asseveram alguns estudiosos que os poetas são tomados por uma espécie de sopro divino, fator que os leva a criar os tais “achados”, versos que se eternizam graças não só a qualidade como, principalmente, pela riqueza do sentido. Sem que tenhamos quaisquer pretensões literárias, muito menos de crítico ou analista, lembramos, ao correr do teclado, alguns versos que, a nosso juízo, serão reverenciados enquanto existirem pessoas com sensibilidade para tal.
Para começo de conversa, a beleza e atemporalidade do estro:
O sec’lo é grande…
No espaço
Há um drama de treva e luz.
Como Cristo – a liberdade sangra no poste da cruz.
Castro Alves
Seguimos com
O contrário dos tempos de rapaz:
Os desenganos vão conosco à frente
E as esperanças vão ficando atrás.
Padre Antonio Tomás
e…
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.
Manoel Bandeira
Por seu turno ensinou:
…o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar
como o ar confia no campo azul do céu…
Thiago de Mello
Daí, derivamos para os poetas-compositores e vamos logo encontrar:
Luto preto é vaidade
Neste funeral de amor
O meu luto é saudade
E saudade não tem cor.
Noel Rosa
E, cravando em poucos versos um hino a dor de cotovelo:
Me devolve aos meus travesseiros
E perco o meu sono
Que coisa ruim
Eu só sei que a imagem dele
Pregada na insônia
Não desgruda de mim.
Hermínio Bello de Carvalho
Ou comparece com
Enquanto o mar inaugura um verde novinho em folha
Argumentar com doçura com cachaça de rolha.
Vinícius de Moraes
Pintando e bordando para enfeitar a #NoitedoMeuBem num buquê incrível…
A rosa mais linda que houver
a primeira estrela que vier
Paz de criança dormindo,
abandono de flores se abrindo
a alegria de um barco voltando
ternura de mãos se encontrando
e o amor,
o amor mais profundo.
Dolores Duran
Para não abusar da paciência do leitor, os versos que algumas mulheres dizem ser a mais perfeita tradução do momento e da tal sensibilidade feminina do compositor:
O meu amor tem um jeito manso que é só seu
De me deixar maluca quando me roça a nuca
e quase me machuca com a barba malfeita
E de pousar as coxas entre as minhas coxas…
Chico Buarque de Holanda
Agora, em tempo de aniversário, vamos, juntos, entoar:
Quando o verde dos teus óio se espaiá na prantação
Eu te asseguro, não chore não, viu?
Que eu vortarei, viu, meu coração
Humberto Teixeira
Estes os versos de um dos mais constantes parceiros de “Sêo” Luiz, versos que se eternizaram, pela expressão de uma realidade, sentimento e beleza. Traduzem, num só tempo, o sonho de que a plantação reviva verdescente garantindo a safra que, em última análise, se traduz no ansiado pão de cada dia e, ainda, estabelecem a ligação entre o sonho da colheita farta e o de rever a mulher amada.
Não por acaso, #AsaBranca, é considerada por muitos brasileiros como sendo o Hino Nordestino, música de ritmo gostoso e envolvente síntese, na sua letra, de todo o drama do Nordeste árido. Região rica e atraente que, nos períodos de seca, força os homens a se afastarem, em busca de trabalho a algum ganho noutras regiões, fenômeno bem descrito nos versos:
Faz pena o nortista, tão forte tão bravo
Viver como escravo do norte no sul
Patativa do Assaré
Ainda assim, com dor e sofrimento, persiste a esperança que os impele a acreditar na possibilidade de voltar para seu pedaço de terra, e aos braços da mulher amada.
Cabe esclarecer que a Pomba Asa Branca é diferente daqueloutra, a mais conhecida, a que foi transformada num dos símbolos da paz.
A nossa é quase um sinônimo de angústia e sofrimento, especialmente para quem vive nas regiões do flagelo das secas.
Seu nome científico é uma mistura de grego com guarani, Patagioenas Picazuro, que pode ser traduzido como pombo barulhento e de sabor amargo, dado o gosto da sua carne, de acordo com os nativos. Além do mais é tida como ave agourenta que anuncia a chegada das secas.
A música, um clássico de verdade, seria a adaptação de um tema popular que “Sêo” Luiz resgatou das músicas que ouvia na infância, tocadas pelo velho Januário. A despeito disso ele fazia questão de destacar sua atuação e do parceiro Humberto Teixeira, na adaptação do tema folclórico e na colocação da belíssima e emblemática letra. Mas a Asa Branca sofreu, no iniciar do seu vôo, um tantinho do preconceito, ainda presente, que costuma incidir sobre atos e fatos de origem nordestina.
Assim, foi motivo de restrições e picuinhas de parte dos músicos que participaram da histórica gravação de 03 de março de 1945, integrantes do #RegionaldeCanhoto. Dizendo que Asa Branca parecia com cantiga dos cegos nordestinos que pediam esmolas nas ruas, um deles empunhou uma vela acesa e fizeram uma fila, entoando a música.
A história foi contada por Humberto Teixeira ao cearense Miguel Ângelo de Azevedo, o Nirez.
Agora, tratemos de ouvir a Asa Branca do “jeitim” que Sêo Luiz gostava de cantar.
Alcir Santos é aposentado e leitor compulsivo. Coisa ele diz: “ex um bocado de coisa”, de office-boy, bancário, professor de História e Direito Civil e Prática Forente a juiz. Colunista da Revista Nova Família
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2 thoughts on “Setenta e cinco anos de um hino”
Só célebres talentos, muitos sopros divinos!! Cultura em abundância. Alcir Santos, fonte inesgotável de conhecimento. Parabéns!!